ENTREVISTA

Dr. Manuel Martins

RMD Julho 2023

Dr. Manuel Martins

Fundador e Diretor da Revista Portuguesa de Medicina Desportiva

Depois de tantos anos de trabalho e de dedicação à Medicina Desportiva, o que tem andado a fazer?

Atualmente, jogo Golfe três vezes por semana e faço umas caminhadas. Todas as manhãs faço o meu programa de ginástica que, entre vários exercícios, inclui 250 abdominais e 2 minutos de prancha. Tudo isto é só para me manter em forma por causa do golfe.

Escrevo bastante prosa e poesia que publico com alguma regularidade, leio imenso, estudo medicina uma hora por dia e até 2013 fiz escultura. Continuo a exercer medicina pro bono na área das lesões desportivas.

Foi fundador e diretor da Revista Portuguesa de Medicina Desportiva durante muitos anos. Diga-nos algo sobre esta tão importante publicação.

Em 1982, quando lancei a Revista Portuguesa de Medicina Desportiva, a especialidade ainda não era reconhecida em Portugal. Foi, portanto, uma lufada de ar fresco, que ajudou a que muitos jovens médicos pudessem publicar os seus trabalhos ao lado dos colegas considerados na altura gurus na área.

Artigos como o de um nosso colega estomatologista, atleta olímpico em Montreal, sobre Cáries dentárias e Desporto, hoje não fariam qualquer sentido. Na altura os jovens atletas que se dirigiam aos Centros de Medicina Desportiva para efetuarem os seus examos tentavam enganar os médicos colocando pastilha elástica nas cáries…

Muitos de nós ainda nos lembramos dos Jogos Médicos Nacionais (JMN) que ocorriam nas férias da Páscoa em Troia… era uma semana extraordinária, não era?

Foi o complementar do trabalho da Revista. A Organização Mundial da Saúde, na altura, divulgava uma campanha internacional, onde desafiava a sociedade em geral e os médicos em particular, através de dois slogans: Saúde para todos no ano 2000 e A prescrição galénica de Exercício Físico (EF)”.

Então, pensei que se os médicos nos seus locais de trabalho praticassem EF, as populações que eles serviam perceberiam melhor a mensagem. As várias equipas que iam aos JMN treinavam intensamente para lá obterem os melhores resultados.

O número de inscritos chegou num ano a superar os 800 médicos. Associando a este número, marido e mulher de médicos, mais uma média de dois filhos por casal e acrescentando o corpo de árbitros e demais técnicos para fazerem funcional as 17 modalidades, chegámos a ter em Troia mais de 3000 pessoas.

Era uma semana que deixou recordações até nos mais novos, que ainda hoje me falam dos Jogos Médicos. O crescimento dos JMN foi, de facto, um fenómeno de convívio, desporto, cultura e aprendizagem científica que todos puderam viver e ainda hoje recordam.

Como fisiatra também ligado ao desporto tem vivido a evolução do tratamento do atleta. Que diferenças, nota?

Há uma evolução tal que me transcende e que seria impensável em 1982. A eletromedicina e as diversas técnicas de reabilitação atuais entre outros fatores e, especialmente, o aparecimento da especialidade de MD e do maior número de colegas dedicados à área, fazem toda a diferença em relação ao meu tempo. Recordo, como curiosidade, quando em meados dos anos oitenta criei uma Consulta de Reabilitação Desportiva em Lisboa, a novidade foi tal que, quando um dia tive necessidade de colocar um atleta de alta competição e medalhado olímpico a fazer três sessões de tratamento diárias, os programas da clínica não aceitavam a situação.

Sabemos que é também um maratonista. Quantas Maratonas já correu? Qual a motivação?

Fui maratonista. Em 2016, já a preparar-me para uma cirurgia cardíaca que só viria a acontecer em 2022, fiz a minha última maratona em Lisboa (só a andar por ordem do meu cardiologista), e demorei 5h 37min, e só para poder acompanhar o meu filho na sua 1ª maratona.

Depois de ter corrido 173 meias-maratonas (melhor tempo – 1h 19min), 36 maratonas (melhor tempo – 2h 54min) e três ultramaratonas (melhor tempo – 13h 10m em 100 km, na Bélgica), além das centenas de provas de 15km e de menores distâncias, decidi parar porque quero continuar a ter joelhos para poder jogar golfe. É que já cá cantam quase meio milhão de quilómetros de treino nas pernas e quase 73 anos de idade.

Dê um conselho aos jovens médicos que abraçam a Medicina Desportiva.

Trabalhem com afinco, acompanhem as novas tecnologias e, nos seus clubes, federações ou outros locais de trabalhão onde exerçam, não se deixem pressionar pelos interesses financeiros. Lembrem-se que por detrás de cada atleta está um ser humano que tem uma vida para lá do desporto