ENTREVISTA
Dr. André Moreira
RMD Janeiro 2023
Dr. André Moreira
Coordenador da área de saúde da LIGA
A Área Saúde da Liga Portugal (ASLP) surgiu inicialmente como uma necessidade dos departamentos clínicos das sociedades desportivas. A pandemia por Covid-19 veio reforçar a importância da existência duma área dedicada à promoção da saúde e à prevenção da doença. A Liga Portugal foi pioneira na elaboração de um Plano de Retoma do Futebol Profissional em plena pandemia e este plano, criado pela ASLP, com a preciosa colaboração dos departamentos clínicos dos clubes, foi pioneiro e um exemplo seguido internacionalmente por um grande número de ligas.
Mas o papel da ASLP não se esgota na pandemia. Quais são os objetivos futuros e campos de ação mais relevantes?
Entendemos que a saúde e segurança dos jogadores e dos demais intervenientes no jogo deve ser uma prioridade. Os departamentos clínicos dos clubes têm de ser ouvidos e devem participar ativamente nas orientações desta área. Em boa hora a Liga Portugal chamou os departamentos clínicos para melhorarem os regulamentos no sentido de desenvolverem o atual padrão de serviços médicos prestados nas competições da Liga Portugal. Procuraremos valorizar as competências clínicas dos clubes, otimizar os recursos humanos e materiais, assim como aumentar a homogeneidade dos diversos departamentos clínicos numa abordagem de saúde multidisciplinar.
Acha que os seus conhecimentos em saúde e a sua experiência
no futebol têm sido uma mais valia no desenvolvimento deste departamento?
O facto de ter sido árbitro de futebol e ter tido a experiência como delegado da Liga Portugal deu-me um conhecimento mais aprofundado dos valores da instituição e do futebol profissional em Portugal. Creio que os conhecimentos em saúde são uma mais-valia e permitem integrar estas diferentes realidades. Com a ajuda dos departamentos clínicos dos clubes já foi possível, por exemplo, criar fichas técnicas médicas para os estádios da Liga Bwin e Liga Sabseg, assim como um guia de requisitos médicos mínimos para todos os jogos organizados pela Liga Portugal, o qual esperamos ver finalizado em breve.
No programa nota-se a preocupação de realçar a medicina desportiva como promotora do exercício físico para a promoção da saúde…ou seja, o Ministério da Saúde deveria aproveitar melhor esta especialidade? Se sim, de que forma?
Essa é a questão de um milhão de euros… certamente haverá várias visões diferentes entre as partes, umas mais financeiras, outras mais científicas e ainda outras mais logísticas.
A DGS, nomeadamente o Programa Nacional para a Atividade Física, tem tentado olhar para isso, mas ainda sem grande impacto (embora estejam num ótimo caminho).
A minha opinião é que não há dúvidas de que o Ministério da Saúde e o Sistema Nacional de Saúde têm, obrigatoriamente, de olhar para o papel desta especialidade médica de maneira diferente. Falamos em Medicina Desportiva e só nos ocorre os grandes atletas, grandes clubes e o estrelato… Mas não: cerca de 2/3 da especialidade não é isso! A promoção de saúde e a prevenção de doença são primordiais na sustentabilidade da saúde em Portugal e o exercício é parte integral desse processo.
Quais os projetos que estão previstos para esta Área de Saúde?
A visão estratégica que temos para a Área Saúde inclui a definição de um conjunto de protocolos que privilegiará, acima de tudo, a saúde dos jogadores. Paralelamente, iniciámos um plano de atualização e formação em diversas temáticas, numa perspetiva multidisciplinar da saúde que entendemos ser absolutamente necessária. Já realizámos alguns workshops, temos calendarizada a realização de curso de SBV e DAE e pretendemos continuar a apostar nestes eventos formativos, onde se incluirá um curso de formação avançada em medicina desportiva de emergência. Os projetos que pretendemos implementar num futuro próximo passam pela acreditação de todos os profissionais de saúde inscritos na Liga Portugal, assim como a categorização de todos os departamentos clínicos. A acreditação reconhecerá a aptidão de todos os profissionais de saúde para a exigência da atividade clínica específica do futebol profissional e servirá de estímulo a melhoria contínua.
Em relação à formação, o que está planeado pela Liga Portugal para os profissionais de saúde?
Esta direção da Liga tem vindo a fazer uma forte aposta na formação. Assim, também todos os elementos dos departamentos médicos devem, na nossa opinião, dispor de requisitos para poderem ser inscritos nas nossas competições. Todos sabemos o mediatismo e impacto desta atividade e temos de garantir elevados padrões de credibilidade e de segurança para todos os intervenientes e participantes. Os próprios departamentos médicos, no seio dos grupos de trabalho em curso, reconhecem a necessidade da maior qualificação e padrões para o exercício da atividade. Apenas com profissionais qualificados e atualizados com as exigências do futebol profissional se pode estar devidamente preparado para a prevenir e tratar adequadamente lesões dos jogadores, reduzir os tempos de return-to-play, potenciar o seu rendimento desportivo e lidar com qualquer emergência médica que possa surgir.
Além da acreditação dos profissionais de saúde falou-nos na categorização dos departamentos clínicos… em que consiste este projeto?
À semelhança do que já existe, por exemplo, para todos os estádios das competições organizadas pela Liga Portugal, ao nível das infraestruturas também pretendemos implementar a categorização, por níveis, dos departamentos clínicos. Esta categorização terá uma série de requisitos que são muito objetivos e que incluirá, por exemplo, a avaliação dos recursos humanos, as infraestruturas e equipamentos, a capacidade instalada para lidar com emergências médicas e a atualização ou formação dos profissionais de saúde.
Qual o maior desafio que a Área da Saúde enfrenta?
Os desafios são diversificados quando se desenvolve um novo projeto e se traçam objetivos. Julgo que o maior desafio será o da consciencialização da importância dos departamentos clínicos para as sociedades desportivas. É fundamental que tenham consciência que as áreas de saúde e de performance dos jogadores não são um custo acrescido, mas um investimento. Investindo na qualificação dos profissionais de saúde, em infraestruturas e em equipamentos, estarão mais aptos a otimizar os cuidados de saúde e o rendimento desportivo dos jogadores e valorizarão o seu maior ativo, potenciando os resultados desportivos e económicos futuros.